Retratos do autor presentes na obra Luis Humberto: a luz e a fúria (2008),
organizada por Nahima Maciel.
Há dez anos, era lançado o livro Luis Humberto: do lado de fora da minha janela, do lado de dentro da minha porta (Tempo D’Imagem, 2010). Uma aula-magna de fotografia. A publicação tentou mostrar (e conseguiu) a essência do mestre: as clássicas cenas políticas de Brasília, nas décadas de 1970 e 1980, e o seu entorno familiar. É uma bela crônica.
Formado em arquitetura e professor da UnB – Universidade de Brasília, Luis Humberto (1934-2021), na década de 1960, era um atuante arquiteto, responsável, inclusive, pela construção da futura Faculdade de Educação da UnB. Mas, a fotografia já estava na sua mira e interesse.
Mentor, gênio, mestre. Alguns adjetivos usados por diversos fotógrafos ao se referir a Luis Humberto. Porém, podemos usar as mesmas palavras para quando o carioca radicado em Brasília se aventura pelas letras, pela reflexão. Autor de diversos artigos, Luis Humberto é o que chamaríamos hoje de pensador da fotografia. No entanto, ele trouxe, há 40 anos atrás, temas que hoje são atuais e contemporâneos: a importância do editar, do editor, do ensaio, a fotografia como ficção, a importância da fotografia como linguagem e disciplina.
Em 1983, uma seleção de artigos – publicados entre 1967 e 1982 – foram compilados no livro Fotografia: Universos & Arrabaldes, que inaugurou a Coleção Luz & Reflexão da Funarte. O livro aborda temas ainda atuais, pertinentes e necessários: Editor de fotografia: uma necessidade; Fotografia e Ideologia; Fotografia? E a vida?; E a Fotografia, tem mesmo importância?. Na apresentação desse livro, o então coordenador do Núcleo de Fotografia da Funarte, Pedro Vasquez, resumiu:
A necessidade de um trabalho dessa natureza (a coleção) é mais do que evidente, tendo em vista a prática generalizada de tratar a fotografia como mero “documento iconográfico”. Postura empobrecedora, que revela o completo desconhecimento do real potencial expressivo da fotografia.
Ainda na apresentação, agora escrita pelo próprio Luis Humberto, ele resume com maestria toda a sua reflexão:
Minhas preocupações ultrapassam o âmbito das questões envolvendo a fotografia, uma vez que, sendo ela um produto da inteligência e da emoção de seres humanos, permite análises e especulações em outras direções.
Luis Humberto é um patrimônio da nossa fotografia, do nosso fotojornalismo e do pensamento sobre a fotografia no Brasil. Pioneiro e visionário. Recomendo muitíssimo o perfil escrito pelo jornalista Moracy de Oliveira, onde Luis Humberto é analisado em suas opções com a prática enquanto fotógrafo:
Assim, ao optar pelo fotojornalismo trouxe consigo a consciência que o diferenciava do “tirador de retratos”. Ele queria mais. Aqueles bonecos, retratos submissos e oficialescos de personalidades públicas, usados fartamente em revistas e jornais, estavam fora de seu radar. “Aquilo eu não faria mesmo”, repete ainda hoje. A cultura, superior àquela encontrada no meio, “uma terra de cangaço”, o domínio da linguagem e da técnica, logo lhe deram visibilidade.
Por muitos anos, Luis Humberto escreveu a coluna “Fotopinião” na revista Irisfoto. Aqui, disponibilizamos quatro textos que considero importantes para o entendimento acerca do pensamento de Luis Humberto:
IRIS nº 374 – setembro de 1984
Em favor de uma crítica confiável
A posição do crítico, por si só, confere um excessivo poder de vida e de morte. É necessária a aguda consciência dos perigos que isso representa, para si e para os outros que, de algum modo, de sua opinião dependem.
Ele tem um papel de rigoroso fiel de um processo cultural, ao emitir uma constante avaliação sobre os produtos que são destinados ao público. É um trabalho honroso e, se considerado seriamente, áspero e pouco gratificante, na medida em que sua independência vai lhe trazer frequentes aborrecimentos e torná-lo mais e mais solitário.
IRISFOTO nº 377 – dezembro de 1984
Obscura câmara clara
Lembre-se moço, você que invade a vida dos outros, burla o tempo e retém momentos que não são seus; de seus compromissos com sua época, e sua fraca verdade.
IRISFOTO nº 378 – janeiro/fevereiro de 1985
Fotografia: é urgente e necessário aprender a pensá-la
Não podemos nos enclausurar em traficâncias paroquiais com os nossos pares e aceitar, apenas deles, o reconhecimento ou a crítica, isso acaba por pauperizar as possibilidades de uma revisão mais ágil de atitudes com relação ao nosso ofício. Nosso trabalho não pode ser preservado em santuários, mas, ao contrário, se exposto e fustigado, estará sendo submetido a provas que definirão sua relevância e justificarão ou não sua permanência como referencial. Só o tempo vai determinar se existirão reverências e se elas serão justas e merecidas.
IRISFOTO nº 383 – julho de 1985
Fotografia, ainda a questão do ensino
Devemos entender que a expressão visual sempre esteve presente na história do homem. Ela é decorrente de uma necessidade visceral, tornando-se concreta em função de um suporte existente e de uma tecnologia disponível em um dado momento.
Alexandre Belém
Jornalista, editor e co-fundador da editora Olhavê.